Preconceito: Pelo Fim dos Olhares Tortos

Segundo entrevistadas, o preconceito está no olhar e não na boca

Por Anete Poll

Natasha e Caroline
Natasha, à frente, e Caroline, atrás

- Nós estamos aqui, temos o direito de frequentar todos os ambientes como qualquer outra pessoa. O tempo de nos esconder, viver nas sombras, à margem da sociedade, acabou. Continua difícil, mas hoje já está melhor, porque muitas, como nós, lutaram no passado, para que houvesse essa mudança. E, amanhã será ainda melhor para as gerações futuras, pois estamos aqui, lutando exatamente para isso – inicia Caroline de Barros.

Vaidosas? Sim. Femininas? Ao extremo. Assim, são as transexuais Caroline Barros e Natasha Cardoso. Determinadas, não escondem o que são, nem o que querem. Refutam o preconceito, rechaçam os olhares “tortos”. Saem às ruas, trabalham, são independentes. E, sim, dizem que o preconceito existe. Mas, nada escancarado. “Hoje, há o preconceito velado. O olhar incomodado de quando passamos. Mas, estamos aqui e não vamos mudar só para agradar”, ressalta Caroline. Natascha diz que sente o preconceito no olhar. “Tudo que está no olhar, não está na boca”, define ela.

Uma se assumiu mais cedo, ainda menina, com 16 anos. Essa é a Natasha. Caroline, se aceitou bem mais tarde, aos 33 anos. O caminho não foi nada fácil, para nenhuma das duas.

Caroline começou a se sentir mais feminina, a partir dos 12, 13 anos. Por questões religiosas, foi guardando seus desejos, seus anseios. “Sempre vi algo de diferente em mim. De certa forma, nem eu me aceitava e, por isso, não conseguia ser feliz”, expõe. Por conta disso, até namoradas teve. “Logicamente, não tinha como dar certo”, completa.

Aos 33 anos, a mãe de Caroline pediu para que fosse a um psicólogo, para tentar uma “cura”. “E ela me ajudou a encontrar meu caminho. Porque foi quando eu resolvi me assumir. Descobri que tinha o direito de ser feliz”, enfatiza Caroline. Mas não foi nada fácil. O preconceito, de cara, não foi na rua, foi dentro de casa. A mãe não aceitava e demorou muito, para que isso acontecesse. Mas, mesmo assim, não precisou sair de casa. Hoje, Caroline tem relação de amor e respeito com os pais. Solteira, diz que sonha em formar uma família. “É normal as pessoas terem o desejo de compartilhar a vida”, observa.

Natasha, por se assumir muito cedo, aos 16 anos, enfrentou muito mais dificuldades. Na escola, as atividades propostas sempre são mais masculinas. “Assim, vivi, até me assumir, o mundo do não. Não tinha o direito de praticar o esporte que eu queria, não tinha o direito de me apaixonar, não tinha direito de escolha”, revela. A partir dos 16 anos, quando assumiu inteiramente a sua identidade de gênero, teve sérios problemas com o pai. Foi quando saiu de casa e teve que arcar com todas as consequências. E, ao invés de se deixar abater, teve mais garra para ir ao encontro de seus objetivos de vida. “Nunca deixei de estudar. Trabalhei muito para poder me formar em técnica de enfermagem. O preconceito sempre foi pequeno, diante daquilo que eu queria”, analisa.


Natasha Cardoso
Natasha Cardoso


Para ela, o preconceito, hoje, só é tolerado, quando vem de um idoso. De amigos e familiares, essa tolerância se esvai. E, quanto aos olhares “tortos” nas ruas, diz que não tem significado nenhum para ela. “O preconceito, hoje, é pura falta de informação. Eu não me diminuo frente a sociedade. Eu me sinto mulher como qualquer outra cidadã. Não me sinto inferior a ninguém. Vou a festas, ao supermercado, vivo a minha vida. Vivo como mulher que sou”, salienta.

Com um corpo, hoje, perfeito de mulher, Natasha começou a tomar hormônios com 15 anos. Com 18, era uma transexual já com cirurgia e silicone nos devidos lugares. “Não me defino como diferente. À sociedade, cabem dois sexos. Está em você se identificar. Ser mulher vai além de uma questão sexual. Ela tem que ter a alma feminina”, acredita. Ressalta ainda que “uma coisa é a necessidade social, a outra é pessoal. A cirurgia de mudança de sexo é pessoal, porque uma mulher não se define pelo órgão genital. Ela se define por atitude, por enfrentar a sociedade, por trabalhar, cuidar dos filhos, ser independente”, aponta. A cirurgia da transformação total será em agosto.

Caroline diz que é tão mulher quanto qualquer outra. Natasha vai mais longe e afirma que: “Esse rótulo de transexual é para te diferenciar na sociedade”. Atualmente, Caroline espera pela cirurgia de mudança de sexo e já está na fila de espera. Também pretende fazer algumas alterações cirúrgicas, para ficar ainda mais feminina. “Vou fazer uma plástica de feminização facial. Pretendo mexer nos lábios, tirar o pomo de adão, colocar silicone nos seios (já definidos por hormônios) e no glúteo. Não vou fazer nada drástico, para não virar uma aberração. Só o necessário”, aponta ela.

Caroline, cansada de ser chamada pelo nome masculino em lugares onde é obrigada a mostrar sua identidade, já tem sua carteira social. Natasha não, pois, para ela, a carteira social não passa de um crachá. E, assim, ocorre com várias outras transexuais. Cada uma tem uma opinião diferente a respeito desse assunto. E cada opinião deve ser sempre respeitada.

Caroline de Barros
Caroline De Barros

Para finalizar, Caroline diz exatamente como elas se sentem:

“Não nascemos mulheres. Não saímos da maternidade com um enxoval rosinha. Não recebemos bonecas de presente no nosso primeiro aninho ou no nosso primeiro Natal. Fomos batizadas com um nome masculino, com o qual não nos identificamos. Infelizmente, não nascemos mulheres, mas nos tornamos mulheres. E, com o passar dos anos, vimos que usar bermudões não tinha nada a ver com o que éramos. E começamos a correr atrás de nossa felicidade e dos nossos direitos. Direito a um trabalho formal, direito a respeito pelo que somos, sem ter que dar explicações, direito a um casamento com um homem que nos assuma, sem pensar no que os outros vão dizer e, assim, constituir uma família, direito a uma formação acadêmica (são poucas as travestis e transexuais que entram em uma faculdade). Queremos nossa integridade física preservada, sem que ninguém se ache no direito de nos violentar, física ou psicologicamente, para que nos tornemos homens de novo, para que possamos andar nas ruas, nas festas, em ônibus, sem que as pessoas nos olhem, como se ali não fosse o nosso lugar. Acho utopia que um dia o ódio e o preconceito venham a acabar. Por isso, não podemos cruzar os braços, e, sim, continuar a lutar por vitórias, para que possamos viver com dignidade, integridade e respeito”.


Fonte: Agora - O Jornal do Sul

2 comentários:

Anônimo disse...

grazie amore bellissima intervista bellissimo articolo spero lo leggano in tanto per un semplice diritto alla vita di ognuno di viverla in piena libertà e con le proprie scelte sessuali...ti adoro grazie ancora e mille baci baci baci

Anônimo disse...

bellissimo articolo bellissima intervista grazie amore viva la vita e viva il diritto di viverla come ogni essere vuole!!! grazie baci baci baci